copyright © Março de 2014 Cristina Dangerfield-Vogt
Istambul, esta cidade entre dois continentes, Europa e
Ásia, entre o Ocidente e o Oriente, vive desde há muitos séculos o
multiculturalismo e soube vivê-lo e aproveitá-lo naquilo que ele tem de melhor
- a tolerância e o enriquecimento dos povos que nesta cidade viveram e vivem
par a par um quotidiano nem sempre fácil de negociar, mas no todo, bem
sucedido. Tem sido porto de abrigo para muitos refugiados e perseguidos pela
intolerância religiosa, étnica, política, para aqueles que fogem das guerras,
recentemente da Síria, e outras catástrofes criadas pela humanidade.
Na
Turquia - Há um longa Tradição de Tolerância
Judeus salvos por
turcos no holocausto é uma história comovente mas que se situa num vasto leque
de muitas outras histórias de tolerância que caracterizam a história do povo
turco e otomano. (ver post anterior)
A tradição de dar
asilo e garantir refúgio aos Judeus perseguidos numa Europa intolerante teve
início no tempo dos sultões otomanos, quando os Reis Católicos de Espanha,
através do decreto de Alhambra, e, mais tarde, D. Manuel I de Portugal,
ordenaram a expulsão ou a conversão forçada dos Judeus ao catolicismo. A
carnificina que se lhe sucedeu levada a cabo pela "Santa" Inquisição,
como era designada, e os seus acólitos, de que se destaca o horrível
Torquemada, o inquisidor-mor espanhol, realizada ao longo de vários
séculos, resultou na fuga em massa dos judeus que conseguiram escapar
daqueles países. Muitos deles encontraram refúgio no Império Otomano.
O sultão otomano, Fatih Mehmed, que conquistou Constantinopla em 1453, chamou
os judeus da Europa para o império. Mais tarde o sultão Beyazit II terá
afirmado que o Rei Fernando de Espanha empobrecia o seu Reino para enriquecer o
Império Otomano. Esta frase, que ficou célebre, não se referiria às riquezas
materiais, mas sim à cultura e aos conhecimentos médicos, científicos, náuticos,
matemáticos, filosóficos, linguísticos, etc. que muitos destes judeus levaram
para o império otomano. Na corte otomana havia médicos judeus e alguns
sefarditas chegaram mesmo a ocupar cargos importantes na administração
otomana.
Um século mais tarde, um turista inglês que na altura visitara Istambul, terá
afirmado que a capital do Califado teria a maior concentração de judeus no
mundo, ou seja, cento e cinquenta mil, só em Istambul.
A convivência e a liberdade dos vários grupos étnico-religiosos só foi possível
sob um sistema de governação muito especial e que nessa altura era inexistente
na Europa.
O sistema otomano dos "millet" - melhor traduzido por nações, previa
um regime em que cada "millet" se auto governava: tinha os seus
tribunais próprios, em sede de direito da família e do direito civil,
liberdade de culto, os seus programas escolares próprios, a sua língua,
etc. O todo era coordenado pelo poder administrativo e instâncias
judiciais superiores do império otomano, baseado na Sharia. A segurança
do estado e a cobrança de impostos era da competência da adminstração otomana.
Contudo, havia isenção de alguns impostos para os "millet".Este
sistema foi um exemplo de pluralismo religioso pré-moderno.
Mesmo hoje, na Turquia moderna, e apesar de muitos sefarditas terem partido
para Israel, vários turcos de etnia judaica se destacam nas áreas das artes e
dos negócios. Izzet Pinto é sefardita, descendente de judeus portugueses, e é o
distribuidor de 'Muheteşem Yüzyıl' (Anos Magníficos - sobre Solimão, o
Magnífico, e o seu tempo) uma telenovela turca que tem sido um sucesso nacional
e internacional, com vendas para mais de 70 países, incluindo a China e a
Rússia, e vários milhões de espectadores. Um sucesso turco-sefardita já que o
distribuidor tem desempenhado um papel fundamental na divulgação internacional
deste "dizi", a palavra para telenovela em turco!
O pluriculturalismo-etnico-religioso na forma dos "Millets" foi uma
característica marcante do quotidiano no Império Otomano, tendo também muitos
judeus asquenazes fugido das perseguições do Leste da Europa procurado e
encontrado refúgio junto dos otomanos. Esta tradição de tolerância tem-se
mantido na Turquia moderna e Istambul continua a ser a cidade das várias
nações, embora menos acentuadamente do que em tempos idos por razões da sua
história do século passado. As tensões que tiveram origem na política dos
países ocidentais que pretendiam partilhar o território otomano entre eles,
resultaram na guerra da independência para defender o país. A perda do império,
que se desagregou e foi ocupado pelos aliados europeus, resultou num país
moderno, a Turquia. O xadrez colonial criado pelos aliados, que procuravam matérias-primas,
gerou efeitos desequilibrantes para a região que ainda hoje se fazem
sentir. Ata Türk, o fundador da moderna Turquia, salvou o país, que se
considerava moribundo, de uma morte que parecia quase certa, e da partilha dos
despojos pelas potências europeias mais aguerridas. A ele se deve a Turquia
moderna.
O sultão otomano, Fatih Mehmed, que conquistou Constantinopla em 1453, chamou os judeus da Europa para o império. Mais tarde o sultão Beyazit II terá afirmado que o Rei Fernando de Espanha empobrecia o seu Reino para enriquecer o Império Otomano. Esta frase, que ficou célebre, não se referiria às riquezas materiais, mas sim à cultura e aos conhecimentos médicos, científicos, náuticos, matemáticos, filosóficos, linguísticos, etc. que muitos destes judeus levaram para o império otomano. Na corte otomana havia médicos judeus e alguns sefarditas chegaram mesmo a ocupar cargos importantes na administração otomana.
Um século mais tarde, um turista inglês que na altura visitara Istambul, terá afirmado que a capital do Califado teria a maior concentração de judeus no mundo, ou seja, cento e cinquenta mil, só em Istambul.
A convivência e a liberdade dos vários grupos étnico-religiosos só foi possível sob um sistema de governação muito especial e que nessa altura era inexistente na Europa.
O sistema otomano dos "millet" - melhor traduzido por nações, previa um regime em que cada "millet" se auto governava: tinha os seus tribunais próprios, em sede de direito da família e do direito civil, liberdade de culto, os seus programas escolares próprios, a sua língua, etc. O todo era coordenado pelo poder administrativo e instâncias judiciais superiores do império otomano, baseado na Sharia. A segurança do estado e a cobrança de impostos era da competência da adminstração otomana. Contudo, havia isenção de alguns impostos para os "millet".Este sistema foi um exemplo de pluralismo religioso pré-moderno.
Mesmo hoje, na Turquia moderna, e apesar de muitos sefarditas terem partido para Israel, vários turcos de etnia judaica se destacam nas áreas das artes e dos negócios. Izzet Pinto é sefardita, descendente de judeus portugueses, e é o distribuidor de 'Muheteşem Yüzyıl' (Anos Magníficos - sobre Solimão, o Magnífico, e o seu tempo) uma telenovela turca que tem sido um sucesso nacional e internacional, com vendas para mais de 70 países, incluindo a China e a Rússia, e vários milhões de espectadores. Um sucesso turco-sefardita já que o distribuidor tem desempenhado um papel fundamental na divulgação internacional deste "dizi", a palavra para telenovela em turco!
O pluriculturalismo-etnico-religioso na forma dos "Millets" foi uma característica marcante do quotidiano no Império Otomano, tendo também muitos judeus asquenazes fugido das perseguições do Leste da Europa procurado e encontrado refúgio junto dos otomanos. Esta tradição de tolerância tem-se mantido na Turquia moderna e Istambul continua a ser a cidade das várias nações, embora menos acentuadamente do que em tempos idos por razões da sua história do século passado. As tensões que tiveram origem na política dos países ocidentais que pretendiam partilhar o território otomano entre eles, resultaram na guerra da independência para defender o país. A perda do império, que se desagregou e foi ocupado pelos aliados europeus, resultou num país moderno, a Turquia. O xadrez colonial criado pelos aliados, que procuravam matérias-primas, gerou efeitos desequilibrantes para a região que ainda hoje se fazem sentir. Ata Türk, o fundador da moderna Turquia, salvou o país, que se considerava moribundo, de uma morte que parecia quase certa, e da partilha dos despojos pelas potências europeias mais aguerridas. A ele se deve a Turquia moderna.
copyright © Março 2014 Cristina Dangerfield-Vogt
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